quarta-feira, 29 de julho de 2009

lembranças do bagaço de cana do engenho

já viu o tempo hoje? acho que vai chover até o final da tarde. essas chuvas de fim de tarde me deixam com sono e sem vontade de fazer nada, parece que me remetem a um tempo de preguiça que eu vivi. é bem provável que o sono que eu vou sentir hoje ainda é um pouco daquele sono que sentia quando era criança e que não podia brincar por causa da chuva. minha mãe dizia que se eu dormisse a chuva passava mais rápido, e que molhava menos também. sim, porque se a chuva molhasse muito eu também não podia brincar porque ia sujar a roupa que ela tinha acabado de lavar. precisava achar o sono, pra chuvar passar e molhar menos, incutia a preguiça em mim, criava o sono em cativeiro, preso no meu quarto, ouvindo o som da chuva lá fora a cavar pequenos buracos na terra seca do quintal. a chuva me dava preguiça e vontade de trabalhar em meu pai, quando eu acordava ele já estava com o saco de sementes na sala, escolhendo as meis belas e gordinhas pra cavucar as escolhidas naquela terra sem vida numa esperança que de lá brotassem, meio que por mágica, uma planta no chão pra ele poder chamar de lavoura. sempre dizia que mulher e semente eu tinha que aprender a escolher. tentava prestar atenção aos seus ensinamentos, mas sempre me perdia entre uma frase e outra imaginando as bricadeiras que poderia ter brincado se não tivesse chovido. não sabia se odiava a chuva pelas brincadeiras perdidas ou se amava aquelas gotículas de são pedro pela alegria que traziam ao rosto enrrugado de meu pai. a verdade é que sempre quis me lembrar dos seus ensinamentos, sobre sementes e mulheres, mas queria também ter em mim a sensação de ter bricado. acho até que brinquei algumas vezes na chuva enquanto minha mãe rezava a novena na casa de alguma comadre, mas a sensação do perdido, as memórias que não sabemos se tivemos, parece sempre ser mais saudosistae melhor de serem sentidas. meu pai sempre foi homem do campo, lavrador, entendedor de sementes, mulheres e de pingas também. minha mãe sempre reclamava das sementes e da pinga, ela dizia que as vezes preferia que não chovesse só pra não ver o velho com as sementes na mão e a pinga ao seu alcance do lábio queimado de sol. ouvia de meu quarto ele gritar : "vai pegar mais uma garrafa pra mim". e eu ia e me sentava no saco aberto de sementes ao lado dele. lembro que meu pai tinha um cheiro engraçado de terra e álcool, e de água também nesses dias de chuva. parecia que os cheiros se misturavam e formavam uma única essência: o perfume de meu velho pai. alguns anos depois, quando voltei ao mesmo sítio, sabia que ele estava atrás daquela montanha de babaço de cana do engenho apenas pelo cheiro que passava por entre o bagaço e formava uma nuvem na entrada do terreno seco. e quando gritava da porteira: "a sua bença, pai", sempre ouvia a cana responder: "deus lhe abençoe, meu filho". e o homem velho que surgia de trás da montanha verde era só o que tinha sobrado daquele homem forte que um dia foi meu pai e que me carregava pelo campo, tinha definhado, o tempo passado e só o cheiro era o mesmo, acho que tinha quele homem apenas como lembrança viva de um homem que parece ter se perdido no passado. será que também me perdi? acho que ele também só vê a sombra do menino que fui... mas o abraço dele em mim sempre o faz voltar a ser o meu pai daqueles tempos e eu volto a ser menino e me escondo no meio de seu carinho.


daniel

sexta-feira, 24 de julho de 2009

a velhice é o preço a ser pago pela juventude

por que você não toca aquela canção?
claro que lembra, a gente tinha acabado de se conhecer e você dizia que eu era o amor da sua vida. e disse também que eu ia ser o pai dos seus filhos, o augusto ia estudar medicina e a carol ia ser o que quisesse pq ia ter mais atitude, ia ser mais independente. você dizia que a carol ia ser que nem você. não sei porque agora você finge que esqueceu de tudo! sempre te disse que não gosto desses seus surtos e chiliques, não gosto mesmo! me dão nos nervos os seus ataques. pára com isso e vem me audar a achar a chave do carro, eu sei que quando eu voltar do trabalho você vai ter esquecido essa bobagem, vai vir com a sua carinha mais meiga e dizer que eu sei que você me ama. vai me jogar na cama e fazer amor comigo como se fosse a primeira vez, tremer o lábios de prazer e dizer que eu sou o seu único homem, como fez também na nossa lua-de-mel. alías, eu acho que a melhor de todas foi aquela vez na casa da sua mãe, no natal, lembra? ainda quer continuar com isso? não acredito que você quer levar isso adiante. tem pena de mim, não percebe que eu não sou mais nem a sombra daquele homem cheio de sonhos que você conheceu, não sou mais aquele homem que chorava porque não podia te dar filhos, não sou mais um jovem seco que não faz filhos. sou só um velho seco que não teve filhos e que agora só tem você. e se quiser me pedir desculpas eu vou aceitar, dizer que não é nada e te afagar no colo. para com isso e vem aqui... isso, senta, fica quietinha. pensa numa coisa boa... pensa em como seriam os nossos filhos e como ficaríamos felizes se eles nos ligassem hoje avisando que iam passar o natal com a gente e avisando que o nosso neto tinha crescido demais e que agora tinha uma namorada. queria conhecer a namorada do meu neto... já pegou no sono? já... você sempre dorme quando falo nos nossos filhos, né? sonha com eles e boa noite, querida.


daniel

quarta-feira, 22 de julho de 2009

a evolução além da omissão

o homem está condenado a agir, até mesmo a omissão é uma forma de ação.
é viver simplesmente. e às vezes ainda acreditamos que podemos nos manter inertes, assistir o filme e nada mudará. muda sim, amigão!
a mera liberalidade, o poder de escolher, e escolher não fazer, não agir e só ver, assistir gera consequencias. o filme fica na mente e sua mente, mesmo que você não queira, processa as informações que aos poucos, num trabalho de formiguinha, vai alterando o que você é na sua essência, atenua ou acentua o seu instinto animal... e quando menos você percebe você mudou sim!
a questão não é evolução é mutação. mudar constantemente, mesmo que não queira, é o carma do homem nesse mundo dos homens que querem sempre novos homens.

e você? que tipo de homem você quer ser? vai assistir?

e por aí vai, né?

daniel

segunda-feira, 20 de julho de 2009

a sua sociedade alternativa. e que seja bem diferente da minha!

o que importa é ser diferente, não ter o mesmo do mesmo sempre,
tentar ser o que se é ao mesmo tempo que tentamos viver dentro do todo,
e de tudo também.

a sociedade alternativa de dentro pra fora
e não de fora pra dentro,
absorver é muito fácil
exalar é que é difícil,
e mais prazeroso também...

é mais ou menos assim: contar a história que eu conto,
você escuta do jeito que sabe
e fala como convém.
eu escrevo poesia, forma e letra
e você lê prosa.

não é?

daniel.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

o fio da navalha

a navalha que abre os sulcos na carne já foi mais gentil
o passar dos anos deixaram o fio mais rude
o dono da navalha não tem mais a mão tão leve
faz da navalha uma faca de cozinha
muda a forma dele e do intrumento
já não lembra de como eram
definhou

a navalha tange o corpo, os encontros abrem marcas
espaçadas e demoradas
nada sentido
só a saudade do fio da navalha e do corpo

terça-feira, 14 de julho de 2009

da janela do seu quarto

"quando falo dessas pequenas felicidades certas, que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem, outros que só existem diante das minhas janelas, e outros, finalmente, que é preciso aprender aolhar, para poder vê-las assim." cecília meireles

eu queria muito aprender também a enxergar essas pequenas felicidades, e entender o que cada uma pode representar. ver o que tem de melhor, os defeitos, as curvas. queria enxergar mais para poder entender os outros e o que querem do que para me lisongear com a minha única plenitude. não que seja um altruísmo, uma fonte de bondade, é só curiosidade mesmo.

na realidade acho que gostaria de saber o que dá pra ver da janela de cada um, comparar com o que vejo da minha e aí, quem sabe, até desenvolver uma inveja ou um pequeno rancor de não ter a mesma visão. a grama do vizinho é sempre mais verde e a janela dele também sempre tem a melhor vista.

e é isso aí!

daniel

segunda-feira, 13 de julho de 2009

andei pensando no que os outros andam dizendo

já andei pensando que em certos momentos é melhor parar, ficar inerte, como se nada mais pudesse ser alterado e então se deixar dominar um certo conformismo. isso porque já disseram também que o ócio é criativo e que um pouco de conformismo (e comodismo) num fazem mal nenhum.

fato é que a vida é feita de pequenos detalhes e estímulos. uma ligação inesperada, uma visita que chega à porta, uma noite de frio, ganhar a metade daquele último pedacinho de chocolate... as pequenas vitórias constroem o dia-a-dia e vão nos conduzindo às manhãs seguintes que poderão, ou não, ser o dia das grandes vitórias.

já ouvi dizer de gente que esperou a vida inteira por estes grandes dias, e pelas grandes vitórias. morreram sentados, esperando entre um cochilo e outro. mas isso é prosa pra outra hora...

e é isso aí!

daniel

terça-feira, 7 de julho de 2009

as coisas passam


as coisas passam como vultos

e na inércia dos movimentos cotidianos

elas passam, desapercebidas e camufladas

ora parecem ilusão, ora um desatino

as coisas passam, indo e vindo, cansadas


queria sentar, pegar todas coisas

admirar as formas deofrmadas de seus vultos

as manchas de seus rostos e a dor de suas feridas


queria parar e ver o meu vulto.